2017: um ano de abrir o coração

Às vésperas de iniciar mais um ano de vida (literalmente!), eu finalmente consegui me organizar e terminar minha retrospectiva de 2017 com as lições e aprendizados de meses na estrada, cheios de experiências únicas, desafios pessoais e profissionais, e de auto-conhecimento.

2017 foi o ano em que (re)abri meu coração e permiti que o amor fluísse para dentro e para fora, mais uma vez. Depois de sobreviver a 2016 e tomar a decisão de viajar rumo ao oriente, 2017 me surpreendeu com incríveis encontros com lugares, pessoas e experiências.

Era 11 de janeiro quando notei que o ano que se iniciava seria diferente.

Chovia muito e eu estava acordada desde as 5 da manhã para pegar o primeiro de muitos ônibus naquele dia. Tive muita sorte por minha companheira de viagem decidir, de última hora, seguir comigo, pois ao chegar no posto de controle de passaportes na fronteira percebi que estávamos com os passaportes trocados. Eu tinha o dela, ela o meu, e apesar da mesma nacionalidade, nós não temos mais nenhuma semelhança.

Eu não consigo imaginar como teria sido o meu ano de 2017 se não tivesse cruzado para o Laos naquele 11 de janeiro. Eu não teria encontrado o Mekong, nem as tecelãs de Xamtai, nem começado um novo hábito, muito menos melhorado minhas habilidades motociclísticas, não teria visto o sol se por no Mekong, nem provado as melhores batatas estilo hashbrown que provei na vida. Muito provavelmente teria tido uma experiência completamente diferente da que tive no norte da Tailândia, perdido o festival da água (Songkran), e mais importante, não teria encontrado as pessoas maravilhosas que encontrei pelo caminho.

Se 2015 foi o ano em que eu fui forçada a abraçar a incerteza sem tempo de pensar ou respirar, e se 2016 foi o ano em que eu tentei estruturá-la um pouco melhor, 2017 foi, sem sombra de dúvida, o ano em que eu me permiti viver a incerteza de forma plena, de contemplar sua beleza e os caminhos que escolhi percorrer, experimentando sem medo de errar.

Eu passei 3 meses no Laos, visitei o norte da Tailândia, passei quase um mês de volta na terra do Tio Sam – com direito a visitar as duas costas e um pouquinho da Louisiania e do Mississippi -, levei minha mãe e irmão para conhecerem um dos meus lugares favoritos desse mundão e ainda tive o prazer de juntá-los à minha família tailandesa, e ainda voei de volta ao Brasil para um projeto de trabalho.

Estar de volta em Sao Paulo depois de 7 anos fora não foi fácil. Nossa reaproximação foi, no mínimo, interessante. Me reconectei e desconectei com velhos amigos, fiz novas amizades, e consegui continuar alimentando minha alma cigana, ficando aqui e ali, graças à generosidade de amigos que são mais do que família, até que encontrei um lugar para morar com um arranjo de curto-prazo, perfeito!

O ano de 2017 também me ensinou que às vezes as pessoas certas aparecem em nossas vidas no momentos errados, e que não há nada que possamos fazer a respeito, a não aproveitar ao máximo os momentos que passamos juntas. Também me mostrou que existem pessoas “erradas” que aparecem nos momentos certos, aqueles nos quais temos uma lição a aprender.

Também foi um ano de amor em termos de aceitação.

Aceitação por quem e como sou. Pelo fato de não ter uma resposta padrão à pergunta “o que você faz” ou “onde é sua casa (lar)”. Eu entendi que não ter uma resposta pronta para essas perguntas não quer dizer eu não faça as coisas que faço com professionalismo, comprometimento e paixão, nem que eu não me sinta em casa nos lugares em que estou. Independente do que as pessoas possam pensar (ou julgar), eu sei que sou uma excelente profissional, filha, irmã e amiga, que sempre estarei lá para apoiar as pessoas que amo e os projetos desafiadores que aparecem no meu caminho.

Com isso, pode vir novo ano astral! 2018, te aguardo!

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Por que você viaja?

IMG_9055.JPGFoi a pergunta feita pelo meu parceiro de remadas, num caiaque perto da ilha de Cat Ba, no norte do Vietnam. Diante do meu silêncio, ele insistiu “Rita, por que você viaja? Qual a sua razão para isso?”

Eu estava sentada na parte de trás e ele não conseguia ver meu rosto – meus olhos de um lado para o outro, tentando encontrar a resposta escondida em algum lugar do meu cérebro. Depois de mais uns minutos em silêncio eu respondi “Ótima pergunta! Eu não sei…”

Eu fui honesta. Nunca pensei ou busquei a razão pela qual eu viajo. Para mim, viajar sempre foi algo mais do que natural. Sempre achei que fosse o meu sangue espanhol, meio cigano. Eu cresci numa família que acha que a ideia de férias perfeitas é dirigir o máximo de quilômetros possíveis durante as férias, fossem 3 dias, 3 semanas, 3 meses ou 3 anos.

Nós continuamos remando, e eu continuei na busca pelo porquê. “Para conhecer novos lugares e culturas? Para ver paisagens diferentes? Para provar novas comidas? Ter novas experiências? Conhecer pessoas?”

“Eu não sei”, eu repeti em voz alta. E eu realmente não sabia.

Por muitas semanas essa pergunta ficou me perturbando. Comecei a perguntar para pessoas ao meu redor. Cada um com uma resposta diferente e eu ainda sem a minha. Até que um dia, enquanto dirigia entre paredões de calcário e observava a mudança de cores no céu antes do por do sol, a resposta veio: eu viajo porque viajar me faz viver o hoje. Porque viajar me mantem no presente.

 

Viajar me permite viver e focar no presente como nunca antes.

Quanto tempo eu gastei nesses meus 30+ anos pensando sobre o passado! Nas coisas que eu fiz ou disse, nas coisas que não fiz ou não disse; nas coisas que eu poderia ou deveria ter feito diferente.

Quanto tempo eu gastei pensando no futuro! O que eu vou fazer? Onde vou estar? Relacionamentos baseados em “deixa eu ver como você vai ser daqui a um tempo para poder decidir se vale mesmo a pena investir nessa relação” me fizeram perder tanto tempo presente. Sempre esperando por algo melhor, por um futuro que nunca chegou.

Nós tendemos a gastar nosso tempo pensando no passado e no futuro e acabamos por viver o presente como um ponto de transição entre o ontem e o amanhã. Não prestamos atenção ao que estamos fazendo agora porque não abraçamos o agora.

Viajando eu encontrei uma forma de viver o presente, um dia por vez.

As pessoas me perguntam como eu passo meus dias. Bem, eu acordo, tomo banho, decido o que vou comer de café da manhã e o que vou fazer com meu dia. Visitar atrações turísticas, trabalhar, escrever, andar sem rumo, ficar deitada na rede. Eu faço uma escolha e desfruto. Se decido trabalhar, eu sei que vou passar horas em frente do computador ao invés de explorar cavernas, cachoeiras, ou me locomover para o próximo destino. Eu decido e abraço minha escolha. Eu não me julgo se escolho fazer nada. Às vezes, “nada” é tudo o que preciso. Às vezes, o que preciso é me jogar na estrada, pegar um ônibus local que leva horas e mais horas para chegar no próximo destino.

Claro que eu penso sobre o futuro. Para onde essa experiência vai me levar? O que eu vou fazer com todas essas coisas que tenho aprendido sobre o mundo, e sobre eu mesma? A questão é que eu não foco apenas no futuro. Viajar me força a tomar decisões hoje, agora, no presente.

Você pode estar pensando “Ah, mas é fácil falar quando você está vivendo desse jeito, conhecendo lugares e pessoas diferentes a cada dia. Fácil quando você não tem que estar num escritório de segunda a sexta.” É verdade que eu não tenho uma vida de escritório, mas isso não significa que não tenho uma rotina e meus rituais diários. Não significa que eu não questiono minhas escolhas ou tenho dúvidas sobre o caminho que escolhi. Não significa que eu não tenho responsabilidades para comigo mesma ou com os outros. Mas o meu processo de tomada de decisão está baseado no presente.

Quando encontro pessoas novas, eu me permito apreciar e aproveitar as curtas ou longas conversas. É provável que eu nunca veja essas pessoas, por isso eu me permito estar presente e apreciar o momento.

O mesmo se aplica às mudanças na paisagem. Nenhuma foto é capaz de capturar a beleza de se observar as mudanças de relevo, cores e aromas de um lugar ao outro. De montanhas para vales, de rios para o mar, da brisa gelada ao calor sem brisa. Se não me permitir sentir tudo isso, como poderei falar sobre isso?

Por que eu viajo?

Para viver o presente; para no futuro contar histórias sobre o meu passado.

E você? Por que você viaja?

Uma Carta de Amor*

[Thakhek – 06 de Março de 2017]

Antes de te encontrar me falaram que você era bacana, mas que eu não deveria gastar meu tempo tentando te conhecer melhor. Duas ou três semanas seriam mais do que suficientes; depois disso eu me cansaria e partiria para outra.

Eu tinha planos de voltar para algo que já tinha despertado meu interesse assim que me cansasse de você. Mas eis que aqui estou, ainda olhando para você, apreciando sua beleza. Completamente apaixonada.

Já se passaram dois meses e você ainda me impressiona e me diverte com suas cores, formas, cheiros e sabores. Você me mantém curiosa e cheia de vontade de aprender mais sobre sua história, suas pessoas, seus medos e desafios. Me diga: como eu posso te ajudar? Como podemos trabalhar juntos? O que eu preciso fazer para continuar perto de você?

Quem me conhece anda dizendo que estou mais bonita. Que meus olhos têm um brilho especial e que meu sorriso está ainda maior. Estão dizendo que irradio alegria e, embora não seja 100% por sua causa – estou alegre porque sinto que estou no lugar certo para meu corpo, mente e alma-, você tem sim um bocado a ver com isso.

Você me ajudou a reencontrar uma antiga paixão: tear; me mostrando  trabalhos lindos e inspiradores, feitos for pessoas talentosas, em cantos remotos.

Você me ensinou a relaxar e seguir a energia de cada momento, inclusive me fez quebrar regras de vez em quando. Me fez provar coisas novas e experimentar mais.

Você me deu amantes e me trouxe um novo amor.

Você me fez sentir anos mais jovem, apesar de eu ficar um ano mais velha ao seu lado.

Nas montanhas, lá no norte, você me mostrou vistas de tirar o fôlego enquanto brincávamos de esconde-esconde durante o por do sol.

E quando seguíamos para o sul eu percebi quanta diversidade você carrega. As montanhas deram espaço a planícies, a brisa fresca a ondas de calor; e quando o ar ficou pesado de tão quente você me apontou águas frescas onde me banhar. E assim encontrei um outro amor: o rio Mekong ❤

Como não te amar?! Por suas redes, seu arroz grudento, suas cavernas, canoas, cachoeiras. Você me surpreendeu com sua diversidade cultural: comida indiana, café japonês, petanque & pastis.

E me surpreendeu ainda mais com suas estradas sinuosas que – apesar do meu histórico de enjôos em longas viagens – me mantiveram sã e salva.

Você também me fez chorar e me deu algumas cicatrizes novas. Ao aprender sobre suas bombas e medos eu não aguentei e não segurei as lágrimas.

Mas acima de tudo você me deu novos amigos, novas inspirações, novas histórias para contar.

Histórias sobre pessoas, lugares, sentimentos.

Histórias de amor.

*Para o Laos

As incertezas do mundo

Ou seria: um mundo de incertezas? Porque do jeito que a coisa anda, não dá mais para saber o que vai ser daqui pra frente; e não importa se você está no Brasil, nos EUA, ou aqui no sudeste asiático.

Há dois meses eu estava entrando num avião com destino à Ásia, sem saber ao certo qual seria meu itinerário ou quanto tempo eu ficaria.

No começo de novembro eu cheguei em Myanmar (Birmânia), ansiosa para viajar por esse país tão fascinante.

Dois dias depois que cheguei em Myanmar, teve eleição para presidente dos EUA.

No dia seguinte à eleição, toda a minha empolgação por estar num país tão exótico cedeu lugar ao silêncio e a descrença. Eu fiquei muda por horas enquanto seguia o resultado da votação que acabou elegendo Donald Trump.

Eu sei que ninguém mais aguenta ler sobre o Trump. Eu escrevi um pouquinho mais sobre isso na versão em inglês desse post, e para quem quiser saber o que eu acho (em inglês) é só clicar aqui e ler a primeira parte do texto.

*

Para além das incertezas que rodeiam os EUA e o mundo como um todo, minha vinda para Myanmar me apresentou um país que também se encontra num momento de indefinições.

Myanmar é um país numa encruzilhada. Não acho que existe descrição melhor. É um país com imenso potencial de desenvolvimento econômico, social e político, que patina ao lidar com décadas de governo militar e com uma democracia frágil e que ainda engatinha de tão nova que é.

Durante as 4 semanas que passei no país, eu visitei as animadas e barulhentas Yangon e Mandalay; a capital do estado de Kachin, Myitkyina; fiz o trekking the Kalaw para Inle Lake; fui até a maravilhosa e mágica Bagan; e visitei a cidade onde morou o escritor inglês George Orwell, Mawlamyine.

Eu não segui um roteiro muito lógico… Acabei me planejando conforme a disponibilidade e agenda dos amigos que estão por aqui. Afinal de contas, não é muito mais legal poder visitar a região com um amigo que é local? Ou ir a um casamento tradicional, para o qual a sua amiga foi convidada? Assim, dessa vez eu preferi ir onde as pessoas estavam, mesmo que isso significasse longas distâncias e muitas horas me locomovendo de um lugar a outro.

Esse meu planejamento sem lógica também contribuiu para aumentar o número de lugares a visitar na próxima vez que eu vier ao país: Putao, ao norte, olhando para a parte leste dos Himalaias; Sittwe, no estado de Rakhine, onde conflitos étnicos/religiosos têm acontecido frequentemente; Naypidaw, a capital fantasma do país – será uma Brasília do século XXI?; Dawei ao sul e as áreas de fronteira com a Tailândia.

Myanmar é, sem dúvida, um país para visitar. Está mudando e mudando rápido. Espero que mude para melhor, apesar de algumas pessoas com quem conversei não estarem tão otimistas.

As pessoas são elegantes e lindas em suas longas saias chamadas longyi. Eu amo, AMO homens usando longyis. Eles ficam tão charmosos! E as mulheres sempre elegantes combinando as cores das saias e das camisas; as roupas sempre ajustadas ao corpo, feitas sob medida. Eu não me lembro de ver gente obesa, mesmo com uma comida tão oleosa. Me disseram que óleo é sinal de riqueza na cultura local. Minha barriga reclamou um pouco… mas ainda assim não vi obesidade.

A paisagem me lembra muito o Brasil. O trajeto entre Mandalay e Bagan, e Bagan e Yangon, me transportou para o cerrado e suas veredas. Cidades como Yangon, Mandalay e Myitkyina me lembraram de cidades do norte e nordeste como Manaus, Belém e Fortaleza. Cachorros de rua, falta de calçada para pedestres, motoristas que aceleram ao invés de brecar quando notam que você está tentando atravessar a rua; pequenas coisas que me levaram de volta ao meu país natal.

As pessoas também têm algo de “brasileiras”; são super hospitaleiras e muito simpáticas com estrangeiros. Quando não são muito tímidas elas retornam o meu “mingalabar” – “oi” em Myanmar – e até puxam um papo e pedem para tirar uma foto comigo. Elas sempre se oferecem para ajudar quando eu pareço perdida, e isso fez com que eu encaresse meu próprio preconceito e bagagem pessoal, pois fico achando que vão me passar a perna, cobrar mais que o devido, ou me mandar para o lugar errado. Mas daí me lembro que aqui é Myanmar. Relaxo e saio rindo de mim mesma.

Algumas breves anotações de viagem (sorry, por enquanto apenas em inglês) sobre os lugares que visitei estão aqui.

O que eu vi e ouvi durante a minha estada em Myanmar só corroborou com a minha ideia inicial de que este é sim um país fascinante. Há ainda muitas áreas proibidas para estrangeiros por causa dos conflitos entre o exército (ligado ao governo, mas independente do poder executivo) e grupos armados e minorias étnicas. Atualmente, um dos conflitos de maior repercussão internacional acontece em Rakhine e envolve a minoria muçulmana.

Ao mesmo tempo que eu tenho um olhar do tipo “uau”, de curiosidade e excitação pelo simples fato de estar aqui, eu também carrego comigo a inquietação, intuição e olhar crítico de geógrafa. Não consigo parar de pensar que apesar de lindo esse é um país onde há muita tensão no ar e muita incerteza com relação ao futuro.

Nesse momento, com o que acontece em Rakhine, a incerteza é um tanto óbvia: como o governo democraticamente eleito em 2015 vai lidar com os conflitos atuais? Porque Aung Sang Suu Kyi, que ganhou o Prêmio Nobel da Paz, não se posiciona sobre esses conflitos?

Há também incertezas menos óbvias: será que as políticas postas em prática estão de fato contribuindo para um desenvolvimento efetivo e para a formação de uma sociedade justa e inclusiva?

Menos óbvio ainda, o que está por trás da forma com que o governo e o exército têm ocupado os territórios e, assim, expressado seu poder sobre ele?

No norte, no estado de Kachin, por exemplo, há um acampamento com famílias do sul do país. Elas foram levadas para lá pelo governo para trabalharem na instalação e manutenção de postes e linhas de transmissão de energia. Minha primeira pergunta foi “porque não contratar mão de obra local?”, “Boa pergunta!” respondeu meu tradutor. Para ele há uma estratégia “não-oficial” de colonização e ocupação de regiões como Kachin – onde 98% da população é Cristã. Vale lembrar que Myanmar é um país budista, e esses trabalhadores vindos do sul são todos budistas.

Numa outra ocasião, meu guia fez um comentário sobre “a necessidade de construir prédios cristãos no topo dos morros, porque os budistas estão se apropriando de todos os morros da região e construindo pagodas (templos) em todos eles.” Para uma geógrafa como eu isso é fascinante. É um claro exemplo de como o poder se expressa sobre o território. Eu tenho total consciência de que meu conhecimento sobre as dinâmicas e complexidades que envolvem política, religião e minorias étnicas em Myanmar ainda é bem pequeno, mas devo confessar que depois de ouvir esse comentário – que veio de uma forma tão natural e despretensiosa – eu passei a olhar a presença budista de uma forma diferente, com um pouco mais de desconfiança, até mesmo mais do que eu gostaria.

Essa inquietação e desconforto só fez aumentar minha vontade de aprender mais e mais sobre esse país, e de seguir de forma mais próxima como as atuais incertezas vão se desenrolar e impactar o desenvolvimento econômico, político e social. O processo pelo qual o país está passando me lembra muito o período pós-governos militares na América Latina. Vai ser interessante voltar para Myanmar daqui há alguns anos e ver qual o caminho que o país tomou.

 

Quer ver fotos? Clique aqui. Ou dê uma olhadinha lá no Instagram @literal.uncertainty

 

Respirando e vivendo Tailândia

Chegou novembro e com ele um sonho se torna realidade: eu vim parar em Myanmar! Mas ainda não é dessa vez que eu vou escrever sobre esse país que tem me fascinado nos últimos anos. Calma! Calma! Logo mais eu compartilho minhas impressões. Abaixo seguem alguns detalhes sobre minhas últimas semanas na Tailândia.

Como eu já falei anteriormente, eu tive muita sorte de ser “adotada” por uma família tailandesa que me ajudou na aclimatação cultural e culinária. Com eles eu passei minhas primeiras duas semanas. Desde que me despedi deles e de Phuket, visitei lindos lugares – mas ainda falta muita coisa para visitar na Tailândia e já estou planejando a volta e os próximos destinos por lá.

Quando você viaja por viajar, sem ter que estar num lugar específico, numa data específica, você acaba se permitindo passar períodos mais longos em cada um dos lugares que visita. Você se deixar levar pela velocidade, cultura e atmosfera local. E é exatamente isso que estou tentando fazer – claro que reconhecendo que o tempo que passo nesses lugares não está nem perto do ideal para assimilar o modo de vida local – e ainda por cima é bem óbvio que eu sou turista estrangeira por aqui (ou como diriam os tailandeses, farang).

Com a exceção de Ko Phi Phi – de onde eu saí correndo depois de passar 2 noites (uma delas em claro) – eu senti que poderia ficar mais e mais tempo em cada um dos lugares que visitei. Todos esses lugares me colocaram em contato com coisas que são muito importantes para minha vida e bem estar; coisas que eu gostaria de incorporar ao meu dia-a-dia. Racionalmente eu sei que não preciso estar nesses lugares para poder continuar escalando, meditando, praticando yoga, evitando carne e álcool; mas parece que essas coisas fluem com mais facilidade em determinados lugares. Taí algo para trabalhar e mudar daqui pra frente!

O primeiro desses lugares foi Tonsai – uma praia em Railay, Krabi, que é um paraíso da escalada em rocha. Lá eu me reconectei com a escalada e percebi, uma vez mais, o quanto esse esporte alimenta minha alma e me energiza. Mesmo estando fora de forma, mesmo meus braços e pernas não aguentando meu peso por muito tempo, mesmo com hematomas espalhados pelo meu corpo, eu me senti completa, plena, feliz de uma forma que só a escalada me faz – e que eu tinha, mais uma vez, esquecido.

Eu saí desse paraíso apaixonada. Apaixonada pela geologia e sua formação rochosa – sério, no meio de uma via eu virei para quem estava me fazendo segurança e perguntei se podia chorar, tamanha a beleza daquela rocha! Apaixonada pela energia de paz das marés alta e baixa. Apaixonada pelas almas lindas – umas mais que outras 😉 – que conheci por lá. Se não fosse por um dos únicos compromisso que eu assumi para essa viagem – um retiro de meditação em Ko Samui – eu acho que ainda estaria em Tonsai. Certamente voltaria para lá. Provavelmente vou voltar.

O retiro em Ko Samui começou no dia 20. Foram quase 7 dias de silêncio total, acordando às 4h30 e indo pra cama às 21h, apenas 2 refeições diárias, e muita meditação sentada e caminhando. Por mais difícil que tenha sido deixar Tonsai, eu sabia que algo muito interessante me aguardava. E estou estava certa.

Ainda rola muita incerteza no estágio em que me encontro nesse mundo da meditação. Eu não faço ideia quais as peças que minha mente e meu corpo vão me pregar; para onde minha mente vai perambular; como manter o foco na minha respiração quando meus pensamentos vagueiam por aí. Nesse sentido, a experiência de respirar, sonhar, andar, comer meditação por uma semana foi uma agradável surpresa. Enquanto tentava domar meus pensamentos e me concentrar no ar entrando e saindo pelo meu nariz, minha mente me levou para lugares imagináveis e inimagináveis. Eu tive visões – reais e psicodélicas, caí no sono durante as sessões de meditação, fiquei entediada, frustrada, fiz listas de coisas a fazer, e-mails a escrever, telefonemas. Até escrevi e-mails e cartões postais na minha cabeça!

Mas para a minha surpresa, a parte mais difícil não foi lidar com o silêncio e com a minha respiração. O mais difícil foi voltar para o mundo “real”, barulhento, cheio de carros e motos, cheio de opções de comida, de gente falando comigo e esperando uma resposta. Daí que a decisão de seguir para Ko Phangan e ficar hospedada num bungalow na praia (por U$4/noite), com um restaurante delicioso a 5 minutos de caminhada, e aulas gratuitas de yoga foi perfeita! E mais uma vez eu senti que poderia ficar por lá – Haas Chao Pao – por mais e mais tempo.

No entanto, tinha uma outra coisa já planejada – quem disse que eu não faço planos? Meu voo para Myanmar sairia de Bangkok e eu precisava começar a seguir para o norte.

No caminho para Tonsai conheci uma brasileira e passamos a viajar juntas. Acaba sendo bem mais em conta poder dividir as despesas – principalmente de acomodação – com mais alguém. Claro que é preciso dar sorte de encontrar alguém bacana. E esse foi o meu caso. Ela acabou se juntando a mim no retiro, onde conhecemos um russo – professor de yoga – que nos seguiu até Ko Phangan. De lá, nós três resolvemos ir juntos para Ko Tao, uma ilha pequena conhecida pela grande oferta de cursos de mergulho – e que, aparentemente, é um dos lugares mais baratos, no mundo, para aprender a mergulhar.

Mergulho, no entanto, ainda não é muito a minha praia. Então quando meus parceiros de viagem se inscreveram num curso de freediving eu decidi cair na estrada a caminho de Bangkok. Lá passei mais tempo com a Namsai, lavei – e sequei!!!! – minhas roupas e organizei minhas coisas seguir, finalmente, para Myanmar!

[Escrito em 08 de novembro de 2016, Yangon, Myanmar]

 

 

 

Um início e um fim

Toda jornada nova se inicia com um fechamento. No meu caso, o início da minha aventura pela Ásia marca o fim de um ciclo de três anos morando nos Estados Unidos, mais exatamente em Boston, de onde sentirei muitas saudades.

Acho simbólico que para chegar à Ásia eu tive que atravessar os EUA de leste a oeste; como se eu só pudesse me despedir depois de apreciar a fascinante geografia norte-americana pela janelinha do avião.

Ainda mais simbólico dizer o primeiro “oi” e ao mesmo tempo “tchau” para o Oceano Pacífico do lado das Américas e assistir a um último pôr-do-sol antes de voltar para o aeroporto de Los Angeles. O sol se pondo é, para mim, a expressão perfeita de impermanência. O sol é sempre o mesmo, mas cada pôr-do-sol é diferente, as cores e formas nunca se repetem. O meu último pôr-do-sol americano ficará na minha lista de favoritos, até que eu possa voltar para esse país que me surpreendeu positivamente e ganhou minha admiração e carinho; onde eu me senti em casa pelos últimos três anos e onde eu aprendi tanto sobre mim mesma.

Quando os planos mudam e as coisas não acontecem conforme gostaríamos, cada pessoa reage de uma forma. A minha parece caótica para quem está ao meu redor, incapacitado de adentrar à minha cabeça e acompanhar os zilhões de pensamentos que tomam conta dela. Mas eu gosto de pensar que minha reação não é caótica, e sim caórdica (caos + ordem, ou ordem no caos). Quando as coisas não seguem conforme planejado minha primeira reação é pânico. Depois do susto inicial, eu ativo minhas ferramentas de sobrevivência psicológica e começo a fazer uma lista com centenas de possibilidades, desenho cenários, exploro opções e sempre, sempre, tenho um plano B. Na maior parte do tempo eu faço tudo isso em voz alta – o que faz com que quem está ao meu redor pense que meu modus operandi seja o caos, quando na verdade eu estou apenas exercitando minhas habilidades de organização mental 🙂 . Quando eu decidi abraçar a incerteza e me abrir para o inesperado, eu já estava trabalhando num plano B. Agora, esse plano virou plano A: explorar o sudeste asiático!

Por que o sudeste asiático? Principalmente porque eu não sabia quanto dinheiro eu seria capaz de juntar durante um ano. Minha outra opção seria voltar para meu país natal, mas meu coração e intuição me empurravam para o lado oposto. Depois de pesquisar um pouco não foi difícil concluir que o sudeste asiático seria umas das regiões mais baratas para viajar e explorar. Essa foi, portanto, a razão número um.

A segunda razão tem a ver com o fato de que eu sou extremamente sortuda e abençoada (e por isso sempre grata!) em ter amigos espalhados por esse mundão. Alguns desses queridos estão na Tailândia, em Myanmar, Bangladesh e Índia. Comecei então a procurar voos para esses destinos. O preço da passagem dos EUA para a Tailândia foi imbatível (USD 520).

A outra razão para escolher tal destino é porque eu sou apaixonada pelo mundo e pelas diferenças – sobretudo culturais – que existem de uma região a outra. Até agora, meu conhecimento do mundo é praticamente restrito às Américas e à Europa. As línguas que eu falo são línguas clássicas do ocidente. Além das diferenças, eu também estou ansiosa para descobrir similaridades entre o sudeste asiático e a América Latina.

Eu estou animada com essa jornada que se inicia. Uma aventura que jamais seria possível se não fosse por planos que mudaram, pela decisão de aceitar que a vida é feita de incertezas e por ter me permitido viver as experiências que vivi durante a jornada que se encerrou com o pôr-do-sol na Califórnia em 26 de setembro de 2016. Onde isso tudo vai me levar? Boa pergunta!

Vamos descobrir juntos.

*

Curiosidades sobre minhas poucas horas na China – em solo ou no avião:

  • Nenhum website ligado ao Google funciona. Obrigada Air China por me avisar que não mandaria minha passagem para meu endereço do Gmail!
  • Fidel não morreu. Jornal da manhã mostra reportagem de cerca de 7 minutos sobre viagem de delegação Chinesa a Cuba. Fotos foram tiradas. Várias mostrando Fidel, inclusive com close-ups.
  • A bordo da Air China as opções para janta são rice ou noodle? Para almoço só pork rice ou duck rice. Gotta love rice ❤
  • Capacete de segurança do limpadores de janela é trançado! ❤ ❤

 

[Escrito em 28 de setembro de 2016, no aeroporto de Pequim.]